segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Fui embora pra Pasárgada.


Procurei pelas gavetas, na estante de livros, na minha caixa vermelha de papéis sem utilidade, nos álbuns antigos de fotografias e nas cartas recebidas, algo que me trouxesse resposta para o que me inquietava. Não sei o que procurava, talvez o meu Eu que amanheceu parecendo não ser mais meu. Sentei no sofá, apática, com os dedos dos pés a brincar com os chinelos e a visão perdida no quadro colorido pendurado na parede da sala. Como se fosse uma visita na minha própria casa, percebi que o que procurava não estava ali, ao meu alcance, pois estava sentindo falta de mim mesma. Pra onde fui que me esqueci de me avisar?Não deixei nada escrito, avisando quando retornar, parti com uma mochila pequena nas costas, que só cabia incertezas e a certeza que algo iria mudar.

O poeta já diria: “às vezes nos sentimos assim, como quem partiu ou morreu”.  Devo ter partido pra Pasárgada, aqui eu não sou feliz e como lá sou amiga do rei, farei ginástica, andarei de bicicleta, montarei em burro brabo, subirei no pau-de-sebo, tomarei banhos de mar. Quando estiver cansada, deitarei na beira do rio, mando chamar a mãe-d'água pra me contar as histórias que no tempo de eu menina Rosa vinha me contar. Fui embora pra Pasárgada, nem adianta me procurar.

domingo, 7 de outubro de 2012

Eu: balanço do novo milênio e retorno aos anos 80.


Li uma reportagem super interessante, em revista homônima, edição 309, cujo título era “7 dias em 1987”. Nesta, o jornalista Felipe Van Deursen se autopropôs um desafio de voltar no tempo e viver como um jornalista do referido ano, com comportamento, vestimentas  e hábitos da época. Para isso, teve que se desfazer de hábitos modernos, facilitados pelas ferramentas da tecnologia da informação- teve inclusive que digitar seu artigo em máquina de escrever- o que não deve ter sido tarefa fácil.

Trabalhar um recorte de tempo de 25 anos, para o leitor mais desavisado, pode parecer algo fácil e nada desafiador, mas quando analisamos que o processo de globalização do mundo teve seu auge neste ínterim, percebemos que há, sim, um grande desafio, pois uma série de mudanças estruturais ocorreu no mundo inteiro e as pessoas tiveram que se adaptar às mesmas, por necessidade dos novos tempos, do novo mercado, das novas mudanças.

Não dá pra imaginar o mundo de hoje com máquinas de escrever, telefones fixos, secretárias eletrônicas e cartas, como meios de comunicação, mas era assim a exatos 25 anos atrás e era assim que as coisas funcionavam. Porém, tais ferramentas não suportaram os novos tempos e tornaram-se obsoletas, limitadas em suas funcionalidades, pois o desenvolvimento da economia e, consequentemente, do comércio, teve seu aceleramento com essa globalização da economia, processo considerado como irreversível no mundo inteiro e que exigiu ferramentas mais eficientes e ágeis, que atendessem a esses novos tempos.

Com a globalização pungente, as empresas tiveram que investir maciçamente em capital humano, qualificando-o, para assim desenvolverem seus diferenciais de qualidade, atraindo, desta forma, um público cada vez maior e mais ávido por novidades. Obviamente, que as mudanças trazidas para os ambientes industriais tiveram impacto direto nos domésticos, pois os consumidores foram desenvolvendo necessidades novas, como possuir um aparelho celular ou um computador com internet e, em contrapartida, abandonar os aparelhos que possuíam, agora sem utilidades. Ainda bem que a arquitetura moderna resolveu resgatá-los e  utilizá-los como requintadas peças de decoração. Que contraditório!

Para que abrir mão de toda essa modernidade e facilidades adquiridas com o avanço da humanidade, das tecnologias e das ciências e se remeter a meados dos anos 80, onde tudo funcionava a passos de tartaruga?  A verdade é que, como o próprio jornalista da reportagem da superinteressante afirma - agora trajado de bermudas cintura alta, camisa sintética, sapatos com meias brancas a mostra e bigodes bem aparados e feitos com gilete, pelo barbeiro da esquina, como bem manda o figurino da época – nesse segundo milênio, estamos sufocados por tanta informação e embora totalmente dependentes das tecnologias, não damos  conta de tudo o que nos impõem “goela abaixo” e esse retorno ao passado representa, nada mais que, uma tentativa desesperada de resgatarmos algo que a modernidade nos tomou de assalto: a paz de espírito. Já estamos percebendo um significante “êxodo urbano”, onde as pessoas estão voltando para o interior, comprando sítios, chácaras, fazendas e reaprendendo a ter hábitos simples, longe de todo o tumulto urbano e suas parafernálias tecnológicas e  em busca do famoso sossego.

Depois de refletir sobre tudo isso, fiquei imaginando o que estaria fazendo agora, domingo a noite, se tivesse 28 anos, minha idade atual, a 25 anos atrás. Nasci nos anos 80,mas não o vivi, como quereria. Confesso que me surpreendi com o turbilhão de ideias que tive pra me diverti, ideias que jamais tive nesses tempos modernos. Curiosamente, detectei que meu estilo de vida combina com esse retrocesso que me propus a fazer e, das coisas que pensei, certamente, uma estaria fazendo agora( até consigo imaginar a cena): daria um jeito de convidar meus amigos mais íntimos para sentarmos na calçada de casa, alguém traria um violão, eu providenciaria as bebidas e comidas.
 Na hora combinada, a turma chegaria, nos cumprimentaríamos com apertados, demorados e sinceros abraços, pegaríamos as cadeiras de espaguete, desfazendo o conjunto de terraço e, no quintal, umas grades de cerveja,  que serviriam de tamboretes para os meninos sentarem. Tiraríamos os chinelos, pondo os pés no chão,ficando mais a vontade, nos posicionaríamos em círculo e logo alguém pediria pra eu buscar as bebidas e os petiscos na dispensa da casa.Enquanto isso, alguém pegaria, no armário de vidro da cozinha, os copos de extrato de tomate, que serviriam para beber o vinho e eu descobriria em seguida, que o “congelador da geladeira  fora descongelado”, naquela mesma tarde, e que o vinho foi posto na parte de baixo, e agora quente, seria complicado beber! mas isso não teria importância para nós. Minha mãe pegaria um pedaço de queijo, que sobrou do café da manhã, e um copo de azeitonas na geladeira e com palitos de dentes, mãos habilidosas e um sorriso de canto-de-boca, iria espetando, alternadamente, “queijo-azeitona-queijo-azeitona”, e logo em seguida, repousando-os em pratos duralex, daqueles que nunca quebram, num movimento rítmico interessante que dá até vontade de fazer. Voltando para a calçada, poria o prato duralex numa mesinha no centro, com aqueles palitos enfeitados, que dava pena de comer de tão bonitos, serviria também o vinho quente, que só os homens teriam coragem de beber e um refrigerante simba pras meninas.
 A música logo começaria...com os olhos fechados, os dedos estalando e às vezes tamborilando no ritmo das batidas do violão, deixaríamos o corpo bailar de um lado para o outro ao som das nossas canções preferidas, que, certamente, seria Legião Urbana. Cantaríamos até o vinho acabar ou até minha mãe aparecer na janela da sala reclamando do barulho e dizendo que não estava conseguindo dormir. Sensibilizados, guardaríamos tudo nos devidos lugares, calaríamos nossas  vozes e  violão e nos despediríamos, na certeza que em breve nos encontraríamos para fazer algo tão agradável quanto esta noite, como discutir sobre um livro ou reportagem legal que lemos sobre o fim da ditadura e possibilidade de surgimento de uma constituição cidadã em 1988, quem sabe falaríamos também de um disco novo do Ultraje a Rigor ou dos Titãs e da possibilidade de termos nossa própria banda de rock'n roll. Tudo isso sem celular, sem redes sociais, sem computador...

É...agora estou certa que seria bem mais feliz se o meu hoje fosse 1987!

 

Geovana Azevedo

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

O amor é um cão dos diabos,mesmo, Bukowski!

        Sempre me recusei a falar do amor, em seu sentido mais literal, afinal, desconheço suas proporções, seus efeitos, pois sempre me escapou, sorrateiramente, por entre os dedos, quando achei que havia finalmente o encontrado. Isso não quer dizer que estou me despedindo dele, prefiro que este seja, apenas, um breve relato de parte do que não vivi durante sua ausência.
      A até bem pouco tempo atrás iniciei uma busca pelo “tal do amor”, queria saber como era seu rosto, o tom da sua pele, seus cabelos e a forma de andar. Comecei, então, a procurá-lo em todos os lugares que fosse, por mais inóspitos que se apresentassem, em todos os olhares, por mais vazios e distantes que se mostrassem, em todos os sorrisos, por mais “sem graça” que fossem,  na ânsia de encontrá-lo.
       Nessa jornada, recorri a inúmeros poetas, conhecedores natos do assunto, para que a minha busca tivesse um direcionamento: “o amor é um cuidar que se ganha em se perder”, diria Camões,“o amor é grande e cabe nesta janela sobre o mar” diria Drummond, ”o amor não se vê com os olhos, mas com o coração”, diria, por fim, Shakespeare. Será mesmo que existe um ser que materialize todas essas definições do amor?E se existe como poderia reconhecê-lo? Os mais românticos dizem que sim.
       É...até aqui, confesso, fracassei na minha busca pelo meu amor e se o encontrei, distraída, não o reconheci. Claro que paixões avassaladoras já me tiraram do prumo e me fizeram gelar as mãos e sentir borboletas vivas no estômago, mas as paixões são efêmeras, como o próprio termo sugere, só provocam sensações imediatas. O amor, o amor genuíno, estado de graça e renúnca, este nunca me aturdiu com seus efeitos e  por tanto desejá-lo, temo não mais querê-lo!
         Concordo: o amor é um cão dos diabos, como preceituou Charles Bukowski!


Geovana Azevedo